A revolução digital transformou radicalmente como os brasileiros planejam, reservam e vivenciam suas viagens. Com 85% dos viajantes nacionais utilizando smartphones para pesquisar destinos, segundo dados da Associação Brasileira das Empresas de Turismo (ABETUR), os aplicativos móveis se tornaram ferramentas indispensáveis para uma experiência de viagem mais eficiente e personalizada.
O Ecossistema Digital do Turismo Brasileiro
O mercado brasileiro de turismo digital movimentou R$ 47,3 bilhões em 2024, representando crescimento de 23% em relação ao ano anterior, conforme relatório da Associação Brasileira de Agências de Viagens Online (ABAV Digital). Plataformas como Booking.com, Airbnb, Latam e Decolar lideram o mercado, mas aplicativos nacionais como Maxmilhas, 123milhas e Viajanet conquistaram fatias significativas com funcionalidades adaptadas ao comportamento do consumidor brasileiro.
“A digitalização do setor turístico brasileiro acelerou cinco anos em apenas dois anos de pandemia”, observa Dr. Luiz Gonzaga Godoi Trigo, professor de Turismo da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em inovação no setor. “Os aplicativos não apenas facilitaram o processo de reserva, mas criaram novas formas de descoberta e experiência turística.”
Inteligência Artificial na Personalização de Experiências
A implementação de inteligência artificial nos aplicativos de viagem representa uma das inovações mais significativas do setor. O Google Trips utiliza algoritmos de machine learning para analisar padrões de comportamento e preferências individuais, criando roteiros personalizados para destinos brasileiros.
A startup brasileira Mapa de Ideias, fundada em 2019, desenvolveu um aplicativo que utiliza IA para sugerir destinos nacionais baseados em perfil psicológico e histórico de viagens do usuário. Com mais de 2 milhões de downloads, a plataforma alcança 78% de assertividade nas recomendações, segundo dados internos da empresa.
Felipe Santos, CTO da Mapa de Ideias e especialista em desenvolvimento de aplicações turísticas, explica: “A IA nos permite processar milhares de variáveis – desde clima e orçamento até preferências culturais – para criar experiências verdadeiramente únicas para cada viajante brasileiro.”
Segurança Digital: Protegendo Dados de Viajantes
Com o aumento do uso de aplicativos de viagem, questões de segurança digital ganharam relevância crítica. Segundo pesquisa da Kaspersky Lab Brasil, 43% dos viajantes brasileiros já foram vítimas de algum tipo de fraude digital relacionada a turismo, principalmente através de aplicativos não verificados ou redes Wi-Fi públicas inseguras.
A Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) estabeleceu em 2023 diretrizes específicas para aplicativos de turismo, exigindo criptografia end-to-end para dados de pagamento e localização. Empresas que não cumprem essas normas podem ser retiradas das lojas de aplicativos brasileiras.
Dr. Ricardo Dahab, professor de Computação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e especialista em cibersegurança, alerta: “A conveniência dos aplicativos de viagem não deve comprometer a segurança dos dados pessoais. Usuários devem priorizar aplicativos com certificações de segurança reconhecidas.”
Transformação das Agências de Viagem Tradicionais
O crescimento dos aplicativos forçou uma reinvenção completa das agências de viagem tradicionais brasileiras. A CVC, maior operadora turística do país, investiu R$ 120 milhões no desenvolvimento de sua plataforma digital entre 2020 e 2024, integrando inteligência artificial, realidade aumentada e consultoria humana especializada.
Leonel Andrade, CEO da CVC Corp, destaca a estratégia híbrida: “Não se trata de competir com os aplicativos, mas de oferecer valor agregado que apenas a experiência humana combinada com tecnologia avançada pode proporcionar.”
Aplicativos Nacionais versus Plataformas Globais
A concorrência entre soluções nacionais e internacionais criou um ambiente inovador no mercado brasileiro. O Maxmilhas, aplicativo nacional focado em milhas aéreas, cresceu 340% durante a pandemia ao oferecer funcionalidades específicas para programas de fidelidade brasileiros que plataformas globais não contemplavam adequadamente.
Dados da consultoria Euromonitor International revelam que aplicativos nacionais detêm 31% do mercado brasileiro de turismo digital, percentual superior à maioria dos países latino-americanos, onde plataformas globais dominam quase completamente.
Internet das Coisas (IoT) na Experiência Turística
A integração de dispositivos IoT com aplicativos de viagem está criando experiências seamless para viajantes brasileiros. O aeroporto de Guarulhos implementou beacons Bluetooth que se conectam automaticamente com aplicativos de companhias aéreas, fornecendo informações em tempo real sobre voos, filas de segurança e ofertas comerciais personalizadas.
A rede hoteleira Accor Brasil utiliza aplicativos integrados com IoT para permitir check-in automático, controle de temperatura ambiente e pedidos de room service através do smartphone, sem necessidade de interação humana.
Impacto na Economia Colaborativa
Aplicativos como Airbnb transformaram a hospedagem brasileira, mas também emergiram soluções nacionais como o Estadia e o QuintoAndar Viagens. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a economia colaborativa no turismo emprega mais de 400 mil brasileiros diretamente e movimenta R$ 8,7 bilhões anuais.
Realidade Aumentada e Experiências Imersivas
A implementação de realidade aumentada (AR) nos aplicativos turísticos brasileiros está revolucionando a descoberta de destinos. O aplicativo “Brasil AR”, desenvolvido pela Embratur em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), permite que usuários visualizem pontos turísticos em 3D antes da visita.
No Cristo Redentor, turistas podem usar o aplicativo para visualizar informações históricas sobrepostas à paisagem real, enquanto na Chapada Diamantina, a ferramenta mostra rotas de trilhas e pontos de interesse através da câmera do smartphone.
Sustentabilidade e Turismo Consciente
Aplicativos brasileiros estão incorporando funcionalidades para promover turismo sustentável. O “Viagem Verde”, lançado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), calcula a pegada de carbono de viagens e sugere compensações através de projetos ambientais nacionais.
A startup GreenTrip, incubada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), desenvolveu um aplicativo que conecta viajantes a experiências de turismo comunitário em comunidades tradicionais brasileiras, distribuindo renda diretamente para populações locais.
Desafios e Oportunidades Futuras
O futuro dos aplicativos de viagem no Brasil enfrenta desafios significativos, incluindo conectividade limitada em destinos remotos e disparidades socioeconômicas no acesso à tecnologia. Contudo, iniciativas como o programa “Wi-Fi Brasil” do Ministério das Comunicações prometem expandir conectividade para 21 mil pontos turísticos até 2026.
A implementação do 5G em principais destinos turísticos brasileiros abrirá possibilidades para aplicações ainda mais sofisticadas, incluindo streaming de realidade virtual em tempo real e traduções simultâneas com inteligência artificial.
O setor continua evoluindo rapidamente, com investimentos previstos de R$ 2,1 bilhões em tecnologia turística para os próximos três anos, segundo projeções da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH).
Sobre o autor: Prof. Dr. Alexandre Panosso Netto é doutor em Turismo pela Universidade de São Paulo (USP), professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP e autor de 15 livros sobre tecnologia no turismo.